PIB: Delícias geladas, vendas quentes

Fabricante de equipamentos para produzir sorvetes, a Finamac consegue, nos mercados globais, mais da metade de seus negócios.

ANTONIO CARLOS SANTOMAURO

Um pai que consertava refrigeradores e fabricava artesanalmente pequenas máquinas de fazer sorvete; um filho engenheiro que projetava foguetes numa indústria bélica e acreditava que poderia desenvolver tecnologia no nicho de mercado vislumbrado pelo pai; finalmente, investimentos bem calibrados em design, marketing e comunicação; o que poderia resultar dessa mistura improvável? Resultou a Finamac, fabricante de equipamentos para a produção de sorvetes criada em Santo André, no ABC paulista, há 27 anos e que, desde então, angariou clientes em mais de 70 países — deles, retira 60% de um faturamento estimado em 14 milhões de reais neste ano. Em 2015, a empresa deu um passo mais ousado no caminho da internacionalização. Abriu uma operação nos Estados Unidos, mais exatamente em Miami, onde mantém equipe comercial e showroom. Ali, finaliza, também, a montagem de alguns produtos, o que facilita o atendimento de exigências específicas das certificações locais.

A tecnologia sempre foi componente fundamental da estratégia da Finamac. No fim dos anos 1980, o fundador e diretor da empresa, Marino Arpino — então um engenheiro empregado na Avibras, indústria de armamentos e material aeroespacial de São José dos Campos — revisitou a tradição familiar e desenvolveu um novo equipamento para a fabricação de sorvetes, mais leve e compacto. Seguindo os passos do pai, montou na sua casa, em São José, as primeiras máquinas da empresa e as expôs numa loja de ingredientes para a fabricação de sorvetes da cidade.

A aposta na inovação franqueou um caminho de crescimento para a empresa embrionária. A rápida aceitação dos primeiros exemplares levou Arpino a aumentar a produção e lhe permitiu, em 1989, desligar-se da Avibras para montar sua própria empresa num imóvel pertencente ao pai, em Santo André — onde está até hoje, em instalações maiores e mais modernas, num prédio de quatro andares e mil metros quadrados. Arpino conta que aqueles modelos iniciais permitiram aumentar o número de fabricantes dos gelados no Brasil. “Antes, os pequenos produtores tinham poucas opções de equipamento”, lembra ele. Quase três décadas mais tarde, a tecnologia continua em primeiro plano: oito pessoas — cerca de 20% dos colaboradores — cuidam hoje da pesquisa e desenvolvimento na Finamac. Seu trabalho resultou em cerca de 40 patentes, algumas delas registradas no mercado norte-americano; é da Finamac a primeira picoleteira (máquina para produzir picolés) patenteada nos Estados Unidos.

As vendas para o exterior começaram em 2002, a partir da demanda de empresários uruguaios que conheceram os equipamentos brasileiros numa feira do setor de alimentação em São Paulo. As exportações cresceram e, em pouco tempo, o leque de clientes internacionais se ampliaria, com o apoio do investimento em sistemas de buscas na web e em campanhas de divulgação traduzidas para o inglês e o espanhol. A Finamac computa, hoje, compradores de seus produtos em todos os continentes: “Já vendemos bastante para o Cone Sul das Américas, para o Oriente Médio e a Oceania; hoje, também fazemos negócios significativos com países como a Espanha e a França”, detalha Arpino.

A preocupação com o design é, desde o início, um diferencial importante da empresa. Segundo Arpino, suas máquinas sempre foram desenhadas para combinar funcionalidade e facilidade de uso com um visual atraente, de forma a incentivar sua disposição nos espaços públicos das sorveterias, à vista dos consumidores. A atenção ao design é tal que acabou por dar origem a um novo negócio.

A estrutura dedicada a essa área evoluiu rapidamente e se transformou em outra empresa, também controlada por Arpino: a escola de computação gráfica Alpha Channel, fundada em 2002. Inicialmente um braço da Finamac, com a qual dividia as instalações, a Alpha Channel tem agora sede própria no bairro paulistano de Vila Mariana e recebeu aval do Ministério da Educação para oferecer um curso superior de Computação Gráfica, cujo primeiro vestibular será em janeiro do próximo ano.

As atividades da própria Finamac, no ramo original de fabricação de equipamentos para a indústria, conservam essa pegada didática. Segundo Arpino, uma parcela importante do portfólio de serviços que a empresa oferece aos clientes é formada por cursos presenciais e online relacionados a todo o processo de fabricação e venda de sorvetes. “Já começamos a oferecer esses cursos também nos Estados Unidos”, diz o diretor.

A terceira perna do tripé de apoio da Finamac são as atividades de comunicação e marketing. Nelas, Arpino dá prioridade às muitas possibilidades abertas pelo mundo digital, na web e por meio do e-commerce. É o caso das ferramentas de busca oferecidas pelo Google — o gigante de tecnologia, a propósito, lista a Finamac como case bem-sucedido de uso de seus recursos. “Fiz cursos de marketing digital e, desde 2005, invisto bastante nessas ferramentas”, diz ele.

A ênfase no marketing digital permite à empresa fazer a maior parte de seus negócios internacionais diretamente com os clientes finais, contornando a necessidade de intermediários. Entre os mais de 70 países nos quais já vendeu equipamentos, são poucos aqueles em que ela mantém representantes — é o caso da Coreia do Sul, do Chile e do Reino Unido. Em seu portfólio, a Finamac oferece equipamentos para todas as etapas da produção e comercialização de sorvetes: de pasteurizadoras, misturadoras e máquinas que acrescentam ingredientes, como flocos crocantes, às já citadas picoleteiras e as vitrines e balcões das sorveterias (a empresa só não produz os frigoríficos e sistemas de armazenamento).


Aliada à capacidade de atender clientes de todos os portes — de produtores artesanais a grandes indústrias —, essa abrangência, segundo Arpino, é um de seus diferenciais no mercado global. “Em todo o mundo, há poucas empresas capazes de oferecer uma linha tão completa de soluções, tanto a pequenos quanto a grandes produtores de sorvetes”, diz ele.

Além de investir em marketing digital, a empresa segue divulgando sua marca e seus produtos em feiras setoriais: apenas no exterior, são pelo menos cinco a cada ano, inclusive a mais importante feira dedicada à indústria de produção de sorvetes, realizada na cidade italiana de Rimini (a Itália é o mais avançado polo da indústria mundial de equipamentos do setor). Para participar desses eventos internacionais, Arpino conta com o apoio de programas mantidos pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), especialmente daqueles desenvolvidos em parceria com a Associação Brasileira das Indústrias de Equipamentos, Ingredientes e Acessórios para Alimentos (Abiepan).

Quando de sua fundação, a Finamac tinha só um funcionário, além do próprio Arpino. Atualmente, tem 45, distribuídos na fábrica de Santo André e no showroom inaugurado em 2013 no bairro do Ipiranga. O braço norte-americano conta com quatro colaboradores, dos quais um se dedica à montagem de equipamentos — uma quinta pessoa está sendo acrescentada para cuidar da assistência técnica aos clientes (no começo da incursão ao mercado dos EUA, a empresa ocupou um espaço de apoio a empresas brasileiras mantido em Miami pela ApexBrasil.

A sólida posição da empresa nos mercados externos torna, sem dúvida, menos penosa a travessia da crise brasileira. Mas quais são as perspectivas para o futuro? Os Estados Unidos — que já são o destino de metade das vendas internacionais — devem desempenhar papel ainda mais relevante na estratégia de ampliação das exportações da Finamac. Arpino afirma que até as vendas dirigidas a outras nações são
afetadas pelo que acontece nos EUA. “O mercado norte-americano propicia grande visibilidade em todo o mundo, e em qualquer país suas certificações ajudam a referendar a qualidade de um produto”.

Globalmente, a Finamac compete tanto com marcas tradicionais e produtos de alta tecnologia — como é o caso de alguns concorrentes italianos — quanto com outras cuja oferta é alavancada pelo preço menor, como acontece com fabricantes da China e de países asiáticos. Alguns desses concorrentes já procuraram a empresa visando a estabelecer parcerias ou mesmo adquirir o negócio. Arpino não descarta uma venda futura, mas pretende consolidar uma operação maior antes de qualquer negociação.

Para ele, embora já obtenha com as vendas internacionais um naco importante de seu faturamento, a Finamac demorou um pouco para perceber que deveria atacar o mercado exterior, se quisesse manter o crescimento. Tome-se o que acontece nos EUA. Ali o consumo de sorvetes atinge 20 litros por habitante por ano, ante os 4 litros anuais consumidos por um brasileiro.

Além disso, observa Arpino, mesmo levando em conta mecanismos de isenção tributária para exportações, ainda é muito elevado o custo operacional das atividades produtivas no Brasil. “Embora o custo geral de um produto da Finamac fabricado no Brasil seja similar ao desse mesmo produto fabricado nos Estados Unidos, os entraves burocráticos, as demandas trabalhistas e os trâmites alfandegários pesam negativamente sobre o nosso negócio”, ele pondera. As dificuldades da economia nacional, não por acaso, estão travando seu crescimento — o faturamento este ano deverá ficar nos mesmos 14 milhões de reais registrados em 2015, o que já é motivo para celebração, em vista da retração da economia doméstica no período.

As vendas para o exterior crescerão, em 2016, cerca de 19% em comparação ao ano anterior — de 8,4 milhões de reais para 10 milhões de reais. Já os negócios no Brasil devem cair de 5,6 milhões de reais para 3,4 milhões de reais — uma queda de quase 40%. “Na verdade, se eu tivesse me limitado a atuar no mercado doméstico, a Finamac talvez tivesse hoje, no máximo, um terço de seu quadro de colaboradores”, conclui Arpino. A hora é de continuar a crescer lá fora.

Matéria da revista PIB publicada em 2016.

magnifiercrosschevron-down linkedin facebook pinterest youtube rss twitter instagram facebook-blank rss-blank linkedin-blank pinterest youtube twitter instagram